A pergunta foi a seguinte: professor, todo mundo fala que ler é importante, mas por que o brasileiro lê tão pouco?
Falar da importância da leitura é chover no molhado, praticamente todos sabem que é algo crucial para nossas vidas. Mas uma pergunta levantada por uma aluna esta semana me fez repensar a questão. A pergunta foi a seguinte: professor, todo mundo fala que ler é importante, mas por que o brasileiro lê tão pouco?
Responder a essa questão é algo difícil pois nos remete a vários motivos. Primeiro, se formos levar em consideração todas as interações textuais que temos o dia todo, não lemos tão pouco assim, só pensar em quantas horas ficamos conectados ao celular todos os dias, e segundo os últimos levantamentos, nunca se leu tanto no Brasil, mas em comparação com outros países, ainda estamos muito atrás.
Penso que um dos problemas é que já no início da nossa colonização fomos pensados como uma colônia de exploração. Os portugueses não chegaram aqui com o intuito de fazer com que nossa terra fosse uma potência, ao contrário, tínhamos que ser explorados ao limite para ter nossas riquezas levadas pelos colonizadores, e quantas vidas se foram por causa dessa empreitada. A primeira instituição de ensino superior só foi criada em 1808, a Escola de Cirurgia da Bahia, depois vieram as faculdades de Direito de São Paulo, em 1822 e de Olinda, em 1827, todas ou perto, ou já quando o Brasil ficou independente. Temos que lembrar também que grande parte da nossa população era constituída de escravos que foram libertos em 1889 sem um projeto de inserção na sociedade.
Até pouco tempo atrás bastava a pessoa ter o que hoje chamamos de Ensino Fundamental 1, depois o 2, depois o Médio, hoje cada vez mais se exige o Ensino Superior, mas sempre voltados às demandas do mercado, se pararmos para pensar, em todas essas etapas, pouca atenção foi dada à formação de intelectual de um público leitor no nosso país. Cada vez que uma demanda educacional surge não é pensando na formação do ser humano como um todo, são sempre exigências externas a ele, talvez por isso que até hoje os processos políticos educativos falharam em formar um público leitor.
Vejo cada vez mais que os adolescentes são abertos às novas experiências e quando apresentamos certas leituras, alguns, não todos, ficam muito curiosos com os livros apresentados. Temos que levar algumas coisas em consideração. Alguns professores acreditam que a grande literatura é a única válida para os alunos, então, jovens que leem Harry Potter, Crepúsculo etc., estão “perdendo seu tempo”. Conheço pessoas que começaram por esses livros e hoje são formadas em Letras. Alguns pais chegam até nós querendo dicas de como fazer com que seus filhos leiam mais, eu pergunto se os próprios pais leem em casa, se seus filhos os veem lendo.
Se pararmos para refletir, colocamos uma carga imensa nos ombros dos jovens como se eles fossem os responsáveis por tudo e não é bem assim. Há professores que, ao invés de encantar os alunos, afastam, ou porque perderam o encanto e não leem mais ou somente o fazem esporadicamente ou porque seu orgulho acha que só certos livros podem fazer parte do hall dos livros “legíveis”. Pais exigem que seus filhos leem mas eles mesmos não dão o exemplo. Até entendo que certos pais não tenham o hábito da leitura, o acesso às melhorias na educação são muito recentes, ainda hoje existem escolas sem livros, quanto mais na época dos pais desses alunos, além do mais, muitos deles não tiveram a oportunidade de estudar ou estudaram naquela época em que até a quarta ou oitava série já era suficiente e quando eles vêm até nós querendo saber como fazer com que os filhos leiam mais, eles querem um futuro diferente para seus filhos.
Os professores têm um papel fundamental nesse processo, e não somente o de português. Levar livros para a sala, falar sobre o enredo, deixar os alunos curiosos, falar de séries que foram baseadas em livros que os alunos, porventura nem sabiam, ou se sabiam, estabelecer um diálogo com eles e com os que não sabiam, enfim, são muitas atividades que podemos fazer para estimular a leitura, se vão dar certo só o tempo vai dizer, mas vale a pena pagar o preço, e não nos enganemos, também não vamos resolver tudo em um passe de mágica, só com muito trabalho e confiança no nosso próprio trabalho. Eu como sou um entusiasta da leitura, vejo que a nova geração se interessa sim pela leitura, muitos só não sabem por onde começar, entram na biblioteca e não sabem o que escolher, quando pegam um e não gostam, deixam para lá, mas não podemos desistir, podemos oferecer outro, pois nesse universo vai haver um que ele vai gostar, para isso o professor não pode parar de ler, isso é fundamental.
Ananias E. de Oliveira nasceu em Mari, tem 38 anos, é professor de Língua Portuguesa do Estado da Paraíba, já lecionou Inglês e Espanhol. Formado em Letras pela Universidade de São Paulo em Língua Portuguesa e Língua Espanhola e formado em Filosofia pela Universidade Federal da Paraíba, é autor do livro de poesias Olhos lançado em 2019.