Especialista explica que ainda é cedo para afirmar se a vacina contra a Covid-19 terá de sofrer modificações frequentes, como ocorre contra a gripe comum
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) — Estudos já identificaram 19 pequenas mutações do novo coronavírus, segundo pesquisadores do Instituto Adolfo Lutz, ligado à Secretaria de Estado da Saúde, gestão João Doria (PSDB). Essas alterações são conhecidas tecnicamente como linhagens.
Linhagens diferentes do vírus podem fazer com que uma mesma pessoa fique doente mais de uma vez.
Na última quarta-feira (16), a Secretaria Estadual da Saúde confirmou o primeiro caso de reinfecção do novo coronavírus em São Paulo. A paciente é uma mulher de 41 anos, que mora em Fernandópolis (a 553 km de SP). Segundo a pasta, sequenciamento de genoma identificou que se trata de duas linhagens distintas do vírus, o que justificou a reinfecção.
A mulher de Fernandópllis teve o primeiro diagnóstico positivo de Covid-19 em junho. Ela voltou a testar positivo para a doença 145 dias depois do primeiro diagnóstico. Segundo a secretaria, há outros 37 casos suspeitos de reinfecção no estado, que ainda estão sob análise. Em todo o país, 58 pacientes são investigados.
O infectologista Wladimir Queiroz, do Instituto Emílio Ribas, afirma que a confirmação de uma reinfecção é feita após a comparação do sequenciamento genético do vírus na primeira e na segunda vez. Esse material é obtido nas amostras colhidas nos exames RT-PCR –em que é coletada secreção do nariz e da garganta do paciente por meio de uma haste flexível.
Ele diz que suspeitas de reinfecção “não foram comprovadas justamente porque não tinham a primeira amostra do vírus para fazer o sequenciamento genético”.
O infectologista salienta que não há como afirmar previamente se uma segunda infecção vai ser mais grave ou mais leve do que a primeira.
O diretor de Respostas Rápidas do Laboratório Estratégico do Instituto Adolfo Lutz, Adriano Abbud, explica que todos os organismos sofrem mutações, não apenas o vírus. E que, por enquanto, as mudanças identificadas, não devem interferir no plano de vacinação contra a Covid-19.
“As mutações são muito pequenas, como diferenças nos genes dos vírus. Porém, não é uma diferença que vai alterar a proteína de ligação, que vai impedir com que a vacina atue. Não funciona assim. É óbvio, a gente não pode escrever isso em pedra, mas a chance é muito pequena de essas alterações interferirem em como a vacina vai atuar nos imunizados”, afirma.
O pesquisador diz que a existência das linhagens é diferente do que ocorre no caso da dengue, por exemplo, em que há quatro tipos diferentes de vírus causadores da doença.
“Nesse caso, são pequenas alterações no genoma, mas não são subtipos do coronavírus, por enquanto. São linhagens. No Brasil a gente já identificou 19 linhagens diferentes. Isso não quer dizer que a vacina não vá funcionar com as 19”, explica.
O especialista acrescenta que ainda é cedo para afirmar se a vacina contra a Covid-19 terá de sofrer modificações frequentes, como ocorre com os imunizantes contra a gripe comum. “Essa é uma questão que só vai ser dita no futuro. O vírus ainda é muito pouco conhecido. A gente está convivendo com ele há um ano, e um ano é muito pouco”, explica.
Queiroz também adota tom cauteloso para falar sobre a eficácia da vacina contra o coronavírus –ou seja, se pessoas já imunizadas podem voltar a contrair a Covid-19. “Isso a gente só vai saber na hora que tiver um número muito grande de pessoas vacinadas”, diz o médico, que é consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia.
“Tem coisas com relação à vacina que não conhecemos ainda. Por exemplo: a duração da imunidade. No caso da influenza, a gente sabe que tem que vacinar anualmente. Será que vai ser a mesma coisa com a Covid? A gente não tem essa ideia ainda, porque as primeiras pessoas vacinadas têm algo em torno de sete, oito ou nove meses de imunização”, diz o médico, referindo-se ao período de testes das vacinas.
“Tudo que a gente tem de verdade das vacinas são dados de segurança. As vacinas que chegaram na fase 3 têm perfil de segurança muito bom. E o estudo com vacina não termina na fase três. Quando faz a vacinação em massa, os estudos continuam”, diz Queiroz.
Por esse motivo, o médico explica que as pessoas, mesmo depois de vacinadas, devem continuar com os hábitos de prevenção contra o coronavírus, como uso de máscaras, distanciamento social e higienização frequente das mãos.
Na noite de quinta-feira (17), o Ministério da Saúde afirmou que ainda não havia recebido notificação oficial a respeito do caso de reinfecção no interior de São Paulo. Por esse motivo, a pasta diz que, “até o momento”, o único registro confirmado no Brasil é de uma mulher de 37 anos de Natal (RN). O caso foi divulgado no último dia 10.
Em nota divulgada à imprensa, o ministério informa que há 58 notificações de casos suspeitos de nova infecção pelo novo coronavírus no Brasil, em nove estados. As amostras dos materiais colhidos ainda estão sob análise.
“Para ser confirmada uma nova infecção pela Covid-19, é necessário que o caso suspeito de reinfecção apresente dois resultados positivos de RT-PCR em tempo real para o vírus SARS-CoV-2, com intervalo igual ou superior a 90 dias entre os dois episódios de infecção, independentemente da condição clínica observada nos dois episódios, e as respectivas amostras clínicas sejam encaminhadas para o laboratório de referência da Unidade Federada, para confirmação dos resultados pré-existentes”, diz o a pasta.
Apesar da postura negacionista do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o Ministério da Saúde afirma que o caso “reforça a necessidade da adoção do uso contínuo de máscaras, higienização constante das mãos e o uso de álcool em gel”.
A pasta diz ainda que “o governo federal está buscando o mais rápido possível a vacina confiável, segura e aprovada pela Anvisa, para que todos os brasileiros que desejarem possam ser imunizados”.
Por FOLHAPRESS