Voo fretado pousava no hangar do Governo da Paraíba. Novos trechos da delação da ex-secretária de administração da PB foram divulgados nesta terça.
A ex-secretária de administração da Paraíba Livânia Farias, investigada na Operação Calvário, detalhou como o dinheiro desviado das áreas da saúde e educação saía do Rio de Janeiro e chegava à Paraíba. Segundo novos trechos da delação de Livânia, divulgados nesta terça-feira (7), o hangar do Governo da Paraíba e um coronel da Polícia Militar do estado eram utilizados para a chegada e escolta dos valores, que teriam sido usados nas campanhas eleitorais de 2012 e 2014.
Entenda a Operação Calvário
A operação investiga uma organização criminosa suspeita de desviar R$ 134,2 milhões de recursos que seriam utilizados na saúde e educação. A Calvário identificou fraudes em procedimentos licitatórios e em concurso público, além de corrupção e financiamento de campanhas de agentes políticos e superfaturamento em equipamentos, serviços e medicamentos. Do valor total desviado, mais de R$ 120 milhões foram destinados a agentes políticos e às campanhas eleitorais de 2010, 2012, 2014 e 2018.
Livânia foi presa em 16 de março de 2019. Segundo o Ministério Público da Paraíba, ela recebia, por mês, propina de R$ 80 mil paga pela Cruz Vermelha, Organização Social que administrava o Hospital de Trauma de João Pessoa.
O G1 teve acesso a dois trechos da delação dela, publicados em setembro de 2019 e na segunda-feira (6). Os trechos divulgados nesta terça-feira no Bom Dia Paraíba foram gravados pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB) no dia 16 de abril de 2019.
Livânia Farias, durante audiência de custódia em João Pessoa — Foto: Walter Paparazzo/G1Livânia Farias, durante audiência de custódia em João Pessoa — Foto: Walter Paparazzo/G1
Livânia Farias, durante audiência de custódia em João Pessoa — Foto: Walter Paparazzo/G1
Veja trechos transcritos da colaboração de Livânia Farias ao MP
Segundo Livânia, o dinheiro era trazido do Rio de Janeiro por Ivan Burity, ex-secretário executivo de turismo da Paraíba, que foi preso na quinta fase da operação e apontado como recebedor de propinas, em delação premiada feita pelo ex-assessor de Livânia, Leandro Nunes Azevêdo. Atualmente, Ivan responde ao processo em liberdade.
Livânia: O que é que Ivan fazia? Ele conversava com o dono da empresa, da Brink Mobil, era ‘Seu Valdemar’, ele negociava o percentual de quanto era. Como também com a Grafset, com a Editora Moderna, que já foi agora, depois de 2016, 2017, e essa do Rio de Janeiro. Ele negociava o percentual, ele pegava o dinheiro. Teve ocasião de voos que ele fazia, voos fretados com o dinheiro. Em 2012 houve um voo que veio do Rio de Janeiro, ele foi pegar R$ 1 milhão no Rio de Janeiro, que era da Cruz Vermelha para as eleições de 2012. Veio para o aeroporto, parou no hangar do Estado. Já era tarde, ele ficou receoso de não conhecer a pessoa que estava lá e uma pessoa chamada Bernardo, que era quem ia acompanhá-lo e esperá-lo, ele [Bernardo] tinha ido e não tinha chegado lá. Aí eu entrei em contato com coronel Chaves, coronel Chaves se dirigiu ao hangar, eu me encontrei com ele no meio do caminho, para que levasse o dinheiro e o dinheiro foi para a casa de uma co-cunhada minha. O valor de R$ 1 milhão. E esse dinheiro foi destinado à campanha de 2012.
Ministério Público da Paraíba: E esse dinheiro veio de onde, só para deixar registrado?
Livânia: Esse dinheiro veio do Rio de Janeiro e quem encaminhou foi Daniel, da Cruz Vermelha.
Livânia: Em 2014 ocorreu uma outra viagem em que ele [Ivan Burity] chegou também lá para o hangar do Estado e o coronel Chaves estava lá junto com Bernardo. E aí vinha mais de um milhão nesse valor, e esse dinheiro foi levado para a casa de Bernardo.
MP: Certo
Livânia: E esse dinheiro foi gasto na campanha de 2014.
Daniel Gomes da Silva, operador da Cruz Vermelha (CVB) — Foto: Reprodução/TV Cabo BrancoDaniel Gomes da Silva, operador da Cruz Vermelha (CVB) — Foto: Reprodução/TV Cabo Branco
Daniel Gomes da Silva, operador da Cruz Vermelha (CVB) — Foto: Reprodução/TV Cabo Branco
O Daniel citado por Livânia é Daniel Gomes, operador da Cruz Vermelha e suspeito de ser chefe da organização criminosa, segundo o MPPB. Ele foi preso na primeira fase da operação. O coronel Chaves citado pela ex-secretária é Fernando Chaves, que foi chefe da Casa Militar da Paraíba. Ele morreu em um acidente de carro em agosto de 2014. Bernardo é o gestor da Bernardo Vidal Advogados. Ele é acusado de coordenar um núcleo que desviava recursos de prefeituras com base na confecção de documentos e informações falsos, causando prejuízos milionários aos municípios. A empresa dele chegou a ser contratada pela prefeitura de João Pessoa entre os anos de 2009 e 2011.
O advogado da empresa Grafset, Felipe Negreiros, disse à TV Cabo Branco que não vai se pronunciar sobre o assunto. A produção tentou entrar em contato com a empresa Brink Mobil e com a Editora Moderna, mas não conseguiu resposta até às 15h.
Propina para campanha ao Senado em 2014
Na mesma delação, Livânia falou ainda de um suposto financiamento fraudulento para a campanha de Lucélio Cartaxo (PV), então candidato ao Senado pelo PT, em 2014, na chapa de Ricardo Coutinho (PSB), ex-governador da Paraíba investigado na Calvário.
Segundo a delatora, ela mesmo entregou R$ 300 mil à Zennedy Bezerra, atual secretário de desenvolvimento urbano de João Pessoa e que na época trabalhava na campanha. Lucélio Cartaxo é irmão do prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo (PV).
Livânia: Então o que aconteceu com Zennedy foi no sábado antes das eleições no primeiro turno em 2014. Eu passei para ele… Ele havia pedido R$ 1 milhão e eu disse que não tinha condições. Ele me disse “pelo menos R$ 600 mil” e eu entreguei R$ 300 mil na mão dele, no Canal 40.
Em nota, Zennedy classificou como inverídicos os fatos que relacionam o nome dele ao recebimento de recursos para a campanha eleitoral. Ele disse que está à disposição da Justiça e defende as investigações feitas pelo MPPB na Operação Calvário.
Por G1 PB