Longe de ser um componente que norteia o amor ao próximo, religião tem sido símbolo de discórdia mundial, numa alternância de perseguidores e perseguidos. Intolerância tem desinência de ignorância. O preconceito é a raiz do problema. A filosofia do estado laico não foi aplacada nem mesmo no meio jurídico, que tem confundido a laicidade com proibição. Outro dia vimos pasmos o MPF empunhar a bandeira do estado laico, porém com um pensamento equivocado, como a exigir o banimento das manifestações de fé, em ambiente de uso público. Vemos um paradoxo: ao defender a laicidade, com um foco inadequado, busca tolher a fé de alguns, e aí se posiciona em defesa do desprovido de religiões. Incoerência gritante, porém tênue.
Temos assistido a diversos episódios de intolerância religiosa, em particular, no Brasil, e é fácil, sem qualquer detector de insanidade, descobrir focos de extrema loucura em defesa de dogmas religiosos, ateus e agnósticos, onde ninguém se tolera.
A questão é mundial, e o Brasil está no contexto. No passado, cristãos foram castigados por judeus e pagãos. Mais tarde, como a dar o troco, milhares de judeus foram dizimados através de ações nazistas que visavam exterminar a nação judaica.
Passados séculos, não conseguimos melhorar o ranço da intolerância. Características geopolíticas ajudam a entender um pouco a persistente intolerância, que parece mais recrudescer do que recuar. A religião deveria ser matéria curricular nas escolas, sejam elas públicas ou privadas, porem sem cunho confessional. Por vezes as convicções impermeáveis dos pais não permitem ao menos se discutir o assunto. A radicalização acentua a intolerância. Quando nos sentamos sobre a nossa razão enrustida, estamos condenados à mortalidade do pensamento moderno, inovador e adequado aos tempos. É preciso abrir a cabeça para um conceito diferente daquele que defendemos com afinco.
Todos devem buscar o caminho para combater, com eficácia, a intolerância religiosa que ainda reina em nosso país. Não encontraremos a harmonia entre as crenças de fé se não entendermos que todos têm o direito sagrado de manter, defender e propagar o que acredita, sem, no entanto tentar impor a sua religião como a única possível de se conseguir um lugarzinho no paraíso eterno. Se insistirmos em pensar assim, estaremos fadados ao fracasso e a cada dia teremos mais conflitos, desrespeitos e até atrocidades causadas pela insanidade de crentes, descrentes, ateus, agnósticos e outras vertentes religiosas ou doutrinárias.
Precisamos acabar com o feio e arcaico costume de jugar a religião alheia. Não podemos adjetivar crenças díspares das nossas, pois aí está o “start” da intolerância. Precisamos usar a religião como instrumento de paz, harmonia, serenidade, alívio às dores da alma e às amarguras do coração. Tudo isso com muito respeito e cautela. Hoje vemos o religioso ser execrado pelo descrente e este trucidado pelos religiosos, que de maneira patética se julgam únicos filhos de Deus. Vale o alerta de que o ingresso para o paraíso não é conseguido com uma simples reza decorada ou uma oração eufórica, em alta voz, como faziam os hipócritas.
É possível sim acabarmos com a intolerância religiosa. Não obstante, será necessário curamos a nossa ignorância cultural e ideológica. O tema escolhido pelo ENEM 2016 é uma chave para a abertura do diálogo sobre o tema. Ampla discussão, madura e serena, deve embasar as conversas para acabar com esse mal que tantos estragos têm causado às civilizações seculares.