Desapercebidos, caminhamos para um estágio deprimente de egoísmo doentio e exacerbado. A rapidez com que acontecem as coisas é como uma trava que impossibilita um diálogo do o nosso “eu” psíquico, e sorrateiramente o egoísmo se apossa de nós, e aí não negociamos mais convivência. Tendemos achar que não precisamos mais de ninguém para atravessar a longa caminhada da vida. O verbo ser somente se conjuga no presente do indicativo, na primeira pessoa do singular. Eu sou. Ponto final.
Não me apetece regular a conduta das pessoas, muito menos criticá-las por posicionamentos pessoais sobre os diversos assuntos. A maneira como os outros pensam não podem afetar a minha vida. Esse pensamento traduz a maneira como interpreto a vida sob a ótica da convivência social.
Outro dia vi uma matéria nas redes sociais, em que um grande artista da música popular brasileira, em entrevista, contava como e em que cenário foi feita uma determinada música, em parceria com outro grande nome musical. Chamou-me a atenção quando o artista falou que o mais difícil foi se sentir sufocado quando parte da música invocava o Senhor Deus(com a expressão PAI). Para ele, admitir que exista uma supremacia divina sobre a figura dele era uma coisa que lhe causava um desconforto sufocante. Não admitia nenhum Ser interferir na sua individualidade, pois o seu individualismo e autonomia são coisas que não aceitaria negociar (interpretação minha). Claro que respeito, aceito e não me faz qualquer diferença se o cidadão é cristão, protestante, umbandista, budista, islâmico, evangélico, ou outra denominação qualquer. Sempre terá o meu respeito incondicional. Não costumo misturar as coisas. Relatei esse fato para contextualizar o caráter do individualismo egoísta, onde o indivíduo se rebela com a possibilidade de ser resultado de um Criador. Claro que a questão não é central no dogma religioso e sim na carcaça que se cria para proteger as convicções.
O egoísmo conta com diversas facetas e aí eu queria estender o conceito, porque quando o indivíduo se utiliza de prosélitos corporativistas está praticando o egoísmo também, só que nesse caso o personagem deixa de ser o “eu” e passa a ser “os meus”.
O egoísmo aniquila o altruísmo e os resultados são terríveis. Quando o Ego abraça somente o “eu”, tudo em volta do egoísta se torna diminuto. Ele passa a querer se sobrepor aos seus pares de convivência e não aceita o sucesso sem ser o seu. O egoísta exclui a possibilidade do sucesso alheio. Acredito que a preocupação do egoísta é zero, pois não dá um passo para possibilitar o sucesso de outrem. Ele aceita até a pagar um preço elevado, pois suas atitudes mesquinhas e individualistas determinam o afastamento de afetos, carinhos e respeito e aí ele morre provando do seu próprio veneno, que se apresenta letal.
O egoísmo é facilmente encontrado no cotidiano. No trabalho, podemos nos deparar com aquele que retém saber, temendo perder posição na hierarquia de importância. Para aquele, quanto mais ele guarda a sete chaves o seu conhecimento, mais ele pensa que será insubstituível. Pobre egoísta!
Eu me amo parece ser a chave da moda atual. É evidente que devemos gostar de nós. Porém, quando essa ideia passa a habitar o “eu” sem admitir concorrência, penso que se está concorrendo para um estado de patologia que vai determinar o isolamento, o sofrimento e nos levar à morte, seja ela no sentido real ou figurado.
Não preciso de ninguém para ser feliz é uma verdade. A felicidade começa em nós, no “eu” inteligente. Entretanto, quando admitimos essa verdade como única aí “o bicho pega”. Passaremos a ser intolerantes, arrogantes, prepotentes, ditadores, quando adquirimos um ego ditador que não admite outras hipóteses.
Penso que devamos exercer o altruísmo em todas as circunstâncias. Sabemos que o espaço que nos destina o mundo cada vez mais concorrente é cruel. Porém, entendo que devamos abandonar o caráter de competição a todo custo, quando tratarmos de oportunidades perseguidas por muitos, inclusive nós.
Chega de ditadura! Não aguentamos mais a imposição de vontades. A democracia, que é antagonista da ditadura, parece sofrer abalos, quando uma turma de ditadores de destinos insiste em praticar prosélitos em detrimento do bem coletivo. Estamos experimentando o império capitalista impor a sua marca comprando a tudo e a todos, ditando normas de certas condutas e prostituindo caráteres diversos.
O egoísmo nunca terá fim enquanto não pensarmos um pouco mais no coletivo. Num ambiente piedosamente competitivo precisamos ser resilientes em busca da harmonia. Reconhecer o valor dos outros é uma das premissas do altruísmo.