O Legislativo se reveste das atribuições do Judiciário e garante a lambança. A Dilma viveu seu Getsêmani, durante oito meses, quando o Presidente da Câmara recepciona o pedido de Impeachment, cuidadosamente encomendado, com pagamento de honorários de valor ínfimo, se levarmos em conta o peso do assunto. Quarenta e cinco mil reais é o preço de honorários advocatícios de pequenas causas.
O impeachment da Presidenta foi justo? Não sei responder a essa pergunta, mas tenho a sensação de que o processo foi legal. Falar em golpe, quando todas as instituições funcionaram livremente é esperneio sem embasamento moral. Em algum momento até afirmei tratar-se de um golpe, naquela ocasião em que vazou a fala do Romero Jucá. Entretanto, entendi que aquele fato revelou apenas o medo de alguém que tem o rabo preso pelas falcatruas obscuras e querer fazer de tudo para tornar infrutíferas todas as intenções de se apurar a verdade.
Do ponto de vista do pragmatismo político, a retirada da Dilma em definitivo tem seus aspectos positivos, porquanto a petista fazia parte de um projeto que fracassou, pois embutido no idealismo petista encontrava-se uma realidade assustadora: “a de não querer largar o osso por preço nenhum”.
E quais foram os fatos que levaram à interrupção do projeto, dito bolivariano, do PT? Primeiro temos de fazer justiça: o governo Lula foi bom em algum momento, como um remédio anestésico que estanca a dor. No período “lulista”, a classe menos favorecida teve os holofotes virados pra ela. A pobreza diminuiu, a economia avançou, nossas reservas cambiais eram sólidas e animadoras.
Tudo perfeito! Acontece que para nós fica tudo claro agora: “como tudo que não é alimentado se acaba, nossas reservas se esvaíram”. Fluíram entres os dedos dos (des) governantes. Vivemos uma verdadeira “bolha” econômica que explodiu e atingiu a todos, principalmente a classe pobre e média da sociedade. Hoje amargamos uma alta de preços sem precedentes e um nível de desemprego alarmante, batendo a casa dos doze milhões de pessoas, representando um percentual nada animador.
Foram as ditas “pedaladas” ou os decretos suplementares do plano safra, sem autorização prévia do Legislativo que derrubaram o governo petista? Claro que não! Quem quiser creditar a esses possíveis crimes de responsabilidade que o façam. Quem tem um mínimo conhecimento de operação de crédito não comete o pecado capital de defender que o inadimplemento de uma dívida se constitui em operação de crédito. Aliás, isso não ficou claro, como querem alguns políticos interessados na condenação. Quem insiste na tese o faz por total ignorância ou pura maldade. O TCU não é julgador e sim consultor, portanto não lhe cabe fechar questão nesse entendimento. Por isso, ainda acho que isso vai desaguar no STF, a quem cabe julgar o mérito, já que até agora validou o rito, o que são coisas totalmente diferentes. As raposas velhas do senado pegam carona no vácuo deixado pela legislação e tenta (e consegue) iludir aos mais apaixonados que adoram uma dicotomia.
Abro um pequeno parêntese para registrar a cara de pau de políticos corruptos, cassados, respondendo a processos por corrupção e improbidade, a exemplo de José Agripino Maia, Gleisi Roffmann, Lindberg Farias, Aécio Neves e Renan Calheiros, sem falar no Cassio Cunha Lima, que os paraibanos o conhecem muito bem. Ele é um “ficha suja”, beneficiado pelas falhas da lei, que teve o seu mandato de governador cassado, foi afastado, acusado de corrupção em rombos da SUDENE, e agora se apresenta com uma carinha de santo do pau oco. Esse não nos engana. Pena que os discursos farsantes desses senhores são aclamados por quem não os conhece ou não se dão ao trabalho de pesquisar sobre seus atos. Se o fizerem saberão a quem estão aplaudindo. Claro, todos esses que citei têm um discurso bonito. Palavra fácil, porém de conteúdo prosaico.
Dilma se foi, Está consumado. Volto ao início quando falo de lambança do Legislativo. Pois bem, penso assim: a Dilma Rousseff não foi condenada com o impeachment. Ela foi licenciada das suas funções, por uma decisão senatorial ridícula e apaziguadora. Condenaram a mulher por um crime e em seguida lhe entregaram as “chaves da sela”. Pelo que entendi, a Dilma pode sair candidata a Presidente da República em 2018. Será que estou enganado? E o precedente que se abriu? A Lei da Ficha Limpa foi rasgada. A Constituição também. Os velhos caciques, num acordo inédito e inesperado, mantiveram os direitos políticos de quem acaba de perder o seu mandato obtido nas urnas, por suposto crime de responsabilidade. É surreal. Isso ainda vai dar panos pras mangas.
E os precedentes que se abrem? Temo que uma enxurrada de pedidos de impeachment comece a nos atormentar, pois governadores e prefeitos usam das prerrogativas das pedaladas descaradamente. Ah! Já sei. Muda-se a Lei e os interesses são resguardados. Temos de tirar o chapéu para o Renan Calheiros. Ele conseguiu algo de inusitado: abrandar a dor de um cassado, sabe-se lá com que intenção. O tempo dirá.
O incrível é que o resultado do processo e a pena cominada não agradaram nem a gregos nem a troianos. Oposição e governo estão insatisfeitos. Os dois tencionam recorrer ao STF, cujas decisões não vêm agradando a ninguém, sem falar na queda de braço que assistimos no âmbito da Suprema Corte.
Sinceramente, acho que deveríamos consolidar o afastamento, dar força ao Temer para amenizar os efeitos nefastos dos atos do governo que se retira e ficarmos de olho. Só lamento uma coisa: os protagonistas do sofrimento das ações dos políticos não mudam. Continua a classe média e baixa da nossa sociedade, com predominância para a última que vê algo que conseguiu fugir para, talvez, nunca mais voltar.
Sinceramente, não sou otimista quanto ao nosso futuro, pois mudou o governante, mas o modelo continua o mesmo. Caótico, injusto, penso que somente teríamos um alento: Reforma política ampla para retirar as mazelas do nosso sistema, que facilita a ação de malfeitores, que com alternâncias ludibriam o povo.
Outro dia eu escrevi: “Não vamos ter céu de brigadeiro”. Continuo com o mesmo pensamento.
Fechemos o livro negro. Vamos acompanhar as ações do novo governo e esperar que ele aja de acordo com a palavra, pois esse é o maior desafio do político. Alinhar o discurso às ações. Ele tem uma enorme dificuldade (proposital) em conviver com isso.
Está consumado. O que era impossível em dezembro de 2015, tornou-se realidade. Temos um novo (velho) governo e com ele avivemos as esperanças, muito embora os atores não nos animem.
Tenho um medo e uma esperança. O primeiro é a interferência na Lava Jato e a esperança é que o povo continue vigilante e aceso, fazendo abortar qualquer intenção de jogar a poeira para debaixo do tapete como claramente querem alguns.
Grande desafio do Temer: juntar os cacos de uma economia em frangalhos e unir a turma política que recrudesce em sua saga pelo interesse próprio.
Só nos resta torcer.