Chegou a hora de a primeira geração nascida da política do filho único na China se casar e ter seus próprios herdeiros.
O casamento sempre foi uma instituição de extrema importância para os chineses, que, por tradição, têm no núcleo familiar a sua referência maior. Além disso, é um sinal de status e estabilidade.
A pressão, porém, já não é só dos pais. Desde que flexibilizou, no início do ano passado, a política em vigor há quase quatro décadas, o Partido Comunista quer que a população volte a crescer a passos acelerados.
Mas a China mudou nestes 40 anos e, com ela, as pessoas que hoje estão em idade reprodutiva.
Por mais que os costumes ainda prevaleçam e o casamento continue sendo valorizado, homens e, sobretudo, mulheres têm optado pelas suas carreiras profissionais. Temem por sua segurança no mercado de trabalho.
Além disso, ficou caro ter filhos na China, ainda mais para quem já tinha um. Escolas e saúde não são gratuitos e podem custar muito dependendo da cidade e do tipo de instituição escolhida pelos pais.
A manutenção de crianças pesa no orçamento das famílias, que têm preferido continuar investindo mais e melhor em um único filho.
Dezenas de milhares de filhos da chamada nova classe média vão estudar no exterior, principalmente nos Estados Unidos, onde vão aprender inglês e se preparar para um mercado de trabalho cada vez mais competitivo.
No ano letivo 2015-2016, 328.547 chineses frequentavam faculdades e universidades americanas (reconhecidamente caras), um recorde histórico, segundo dados do Instituto de Educação Internacional.
“Não sei se vou querer ter um segundo filho. Já não está sendo fácil criar a minha filha de quatro anos. Quero dar a ela o que há de melhor. E ter uma segunda criança significaria ter de dividir com que hoje dou a ela”, diz Xiao, de 38 anos, que trabalha na administração de um condomínio em Pequim.
Nas áreas rurais, é comum os pais terem de deixar as suas cidades natais em busca de melhores empregos nos grandes centros urbanos para proporcionar uma vida melhor aos filhos. Estima-se que o fluxo migratório chegue a 100 milhões de pessoas.
‘Mini-baby boom’
Nesta semana, foi divulgado o balanço do primeiro ano após o fim da política de um filho: 17,89 milhões de chineses vieram ao mundo no ano passado, pouco mais do que a população da Holanda.
Trata-se de um recorde para a China do século 21. Mas o episódio, que está sendo chamado de “mini-baby boom” por especialistas, ainda não é suficiente para fazer frente ao problema demográfico que o país deverá enfrentar no médio prazo, com o envelhecimento da população e a redução do grupo de trabalhadores na faixa de idade considerada economicamente ativa.
O número de nascimentos em 2016 é apenas uma pequena fração da população de 1,37 bilhão de pessoas. E não se sabe exatamente se o aumento de quase 8% em relação a 2015 se deve ao fato de ter se tratado do Ano do Macaco no Horóscopo chinês, considerado o segundo melhor pelos chineses.
Talvez não seja coincidência que o recorde anterior tenha sido batido em 2000, que, além de ser a virada do milênio, foi também o ano do Dragão, o preferido daqueles que acreditam nisso.
Existem 90 milhões de possíveis candidatas a ter o segundo filho, apontam os dados oficiais. Mas é preciso saber até que ponto elas vão se deixar convencer pelo fim da restrição.
A previsão da Academia Chinesa de Ciências Sociais é de que a população chinesa atinja o seu ápice em 2025, com 1,41 bilhão de pessoas, para começar a cair e voltar a 1,3 bilhão em 2050.
Para o Partido Comunista, isso deve ter impacto direto sobre o desenvolvimento do país. E essa teria sido a principal razão para flexibilizar a política do filho único instituída na década de 1980.
Pressão
Com o envelhecimento da população, aumentará também a pressão sobre as pessoas que vão precisar trabalhar para sustentar o exército de chineses que estarão aposentados.
O governo pensa em adotar outras reformas capazes de contornar a questão demográfica dos próximos anos e estimular o aumento da população. Enquanto isso, a mídia chinesa já registra cidades em que a política das administrações regionais passou a ser a de incentivar os pais a procriarem.
Na cidade de Yichang, o governo local teria chegado a publicar da sua página oficial uma carta em que pedia à população para ter dois filhos.
De acordo com o site Caixin, a cidade teria uma das menores taxas de natalidade da China: 9,2 nascimentos para cada 1 mil pessoas em 2015, quando a média nacional, de acordo com dados do Escritório de Estatísticas da China, é de 12 bebês para cada 1 mil habitantes.
A agência estatal Xinhua afirmou ainda no ano passado que vários governos locais tinham recebido a tarefa de criar estímulos para as mulheres engravidarem.
Ao longo do ano passado, várias cidades, inclusive as maiores, adotaram leis para ampliar a licença-maternidade, por exemplo.
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